Busologia #2

Hoje embarquei no ônibus circular universitário e havia só um lugar vago: era ao lado de uma estudante que manuseava o telefone celular.
Estava sentada de forma descontraída, não encostada na janela, com as pernas abertas, e ocupava mais da metade do banco.
Eu disse “licença!” e me sentei. Acho que ela nem me ouviu. Ocupei a parte disponível do banco e fiquei com parte da “poupança” para fora.
Entendi o que sentem as mulheres que se sentam no ônibus, metrô ou trem ao lado de um cara folgado com as pernas escanchadas.
Mulheres, sintam-se vingadas! 😁😂🤣😂

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Busologia #1

Hoje eu finalmente percebi por que tanta gente se esforça e até se endivida para comprar um carro, uma motocicleta ou até mesmo uma bicicleta e fugir do transporte público: a trilha sonora que somos obrigados a ouvir nos ônibus às vezes dá engulhos.
Espero que, quando a universidade tiver sua estação de rádio, os motoristas do circular universitário sejam orientados a manter o rádio do ônibus sintonizado obrigatoriamente nela…
Com certeza, seja qual for, a programação da rádio universitária será bem mais agradável.

Coletivo universitário

(Foto: WordPress.)

O trajeto é curto, mas usar o ônibus da universidade às vezes nos propicia experiências curiosas e dignas de observação.
Sempre se acha alguma coisa dentro do veículo, por exemplo. Além de garrafas vazias de água e embalagens de guloseimas, já achei até um par de meias dentro do ônibus; e, recentemente, ao me sentar num dos assentos, vi no chão algo muito esquisito. A julgar pela aparência meio escurecida e encarquilhada, pensei que um morcego tinha entrado no ônibus, morrido dentro dele e se mumificado ali. Mexi naquilo com a ponta do guarda-chuva e verifiquei que era apenas uma casca de banana ressecada.
Tentar entrar no veículo já propicia a observação da vida como ela é. Não se formam filas nas paradas do circular universitário, mas sim bolos de gente que se amontoam em frente à porta do ônibus quando ele para, formando um funil para embarcar nele. Chegar cedo não é garantia de entrar primeiro e tomar um assento vazio. Não raro alguém chega quando o carro já está parado e com os passageiros entrando, e na maior caruda se enfia entre o povo e embarca antes de quem já estava lá. Fura o funil! E sob os protestos de… ninguém. A palavra “fila” deve estar em falta nos dicionários de muita gente.
Geralmente eu chego um pouco antes da saída do ônibus e entro nele por último, mesmo que tenha sido um dos primeiros a chegar ali. Deixo que todos entrem e depois entro eu, mesmo que fique em pé. Pressa para quê?
Acho que causo certa estranheza a alguns alunos, que talvez me olhem com curiosidade. Tenho o dobro da média de idade deles e estou sempre com meu crachá visível. Poucos servidores usam o ônibus da universidade, pois muitos deles têm carro, e talvez os alunos me vejam ali como um tipo de espião ou olheiro da instituição… (Ou pareço eu um barnabé fracassado?) A falta de confiança em quem tenha mais de 30 anos parece ainda estar valendo!
Há algumas semanas, entrei por último e vi um assento vazio no fundo do ônibus. No meio do corredor, um casal de estudantes: um dos membros do casal, sentado num banco; o outro, ao lado e em pé, com uma mochila enorme nas costas e abraçado a quem estava sentado. O corredor estava quase totalmente bloqueado. Com o carro já em movimento e chacoalhando-se, cheguei perto da dupla e disse: “Com licença”. Sem resposta. Repeti com mais ênfase: “Com licença!”. Nada. Estava diante de uma rocha, uma coluna ali plantada. Fiquei nas pontas dos pés, espremi-me como pude e passei quase deslizando sobre o mochilão. Acho que nem perceberam.
(Nas costas de algumas pessoas, mochila parece corcova, que num camelo ou dromedário tem sua utilidade, dada pela natureza.)
Sentei-me no banco vago no fundo do ônibus e fiquei observando o casalzinho ali no meio do corredor, no maior “love”, numa “nice”, ambos alheios ao entorno, e um deles atravancando a passagem.
Logo me veio à mente isto: aquele indivíduo não sobreviveria um dia no transporte coletivo de São Paulo.
Fiquei imaginando alguém bloqueando daquele jeito o corredor de um ônibus da linha Perus-Pinheiros, ou da linha Horto Florestal-USP, ou Jardim Míriam-Vila Gomes, ou Penha-Lapa, Lapa-Socorro, Socorro-Limão, Jardim das Oliveiras-Parque D. Pedro II, Capelinha-Praça da Bandeira…
Seria comido vivo.

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Democracia e autoritarismo: o caso do Uber

Os recentes incidentes ocorridos em cidades brasileiras, envolvendo usuários ou prestadores do serviço de transporte individual Uber e taxistas, demonstram o quanto ainda estamos atrasados no caminho que conduz a uma sociedade verdadeiramente democrática – não apenas no papel, mas de fato.

Em seu clássico – e sempre atual – Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Holanda diz que “A democracia no Brasil sempre foi um lamentável mal-entendido” (26. ed. 9. impr. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 160). Teria ele dito isso como constatação de não estarmos prontos para ela ainda na década de 1930? (Não se pense por isso que o pai do Chico fosse contra a democracia… au contraire!)

O fato, porém, é que podemos – tosca e grosseiramente, reconheço – distinguir da seguinte maneira a democracia do autoritarismo: enquanto este levanta muros a impedir os movimentos do cidadão, a democracia abre caminhos e portas, cabendo ao cidadão escolher se irá ou não seguir tais caminhos ou passar por tais portas, sem que o Estado ou outrem lhe “dite” (daí a origem do termo “ditadura”) o que fazer, mas ficando esse mesmo cidadão responsável por seus atos, suas escolhas.

Não sei se algum dia serei usuário do aplicativo Uber; acho que prefiro os serviços de um taxista conhecido e de confiança.

Mas não posso ser contrário a esse serviço; considerando-se os problemas de locomoção enfrentados por nossa população em todo o país, proibir uma iniciativa de transporte que já teve sucesso em outros países é um passo para trás.

Muitas pessoas não possuem carro e não desejam tê-lo (é o meu caso), mas também querem algo além do péssimo transporte coletivo de que dispomos, e o Uber é mais uma opção. Por que não permiti-lo e regulamentá-lo?

Ao proibi-lo, com o agravante de não permitir discussão pública sobre o assunto, nossas administrações municipais dão mostras de agir autoritariamente, atendendo a interesses cartoriais, corporativos e não visando à coisa pública.